Joseph Nye: Vale a pena tentar diálogo com o Irã

Professor da Universidade Harvard, o cientista político e especialista em relações internacionais Joseph S. Nye acha que os Estados Unidos e o Irã têm "interesses comuns", como a estabilidade do Afeganistão. Para ele, o governo de Barack Obama pode utilizar esses interesses em comum como base de uma estratégia de "poder inteligente" para lidar com um dos países que mais incomodam a maior potência do planeta. Famoso por ter criado conceitos como "poder brando" (soft power), "poder duro" (hard power) e poder inteligente (smart power), Nye concedeu a seguinte entrevista ao jornal "O Estado de S. Paulo":


Como o sr. viu o fato de que a futura secretária de Estado, Hillary Clinton, usou o conceito de poder inteligente para sintetizar sua estratégia de política externa?

Eu fiquei feliz que ela tenha adotado essa ideia. Isto indica o seu entendimento de que o presidente Obama quer ter uma política mais multilateral e diplomática. Você não pode renunciar ao poder duro. Afinal, nós estamos envolvidos em duas guerras, com tropas americanas tanto no Iraque quanto no Afeganistão. Mas tem havido uso insuficiente, como ela disse, de todas as alternativas que estão na caixa de ferramentas. Isto significa mais ênfase em diplomacia, e em diplomacia pública, como assistência ao desenvolvimento, por exemplo.

O que exatamente é o poder inteligente?

É a capacidade de influenciar os outros para conseguir o que você quer. E você pode fazer isso de três formas: com coerção, que é o porrete; com dinheiro, que é a cenoura; ou por atração, que é o poder brando. O poder inteligente é a capacidade de combinar os três - econômico, militar e o poder brando da atração - em estratégias que são eficazes. Então, o poder inteligente é a combinação de poder duro e brando. Mas os problemas que nós vimos no governo Bush é que eles deram ênfase demais ao poder militar, e esqueceram o poder brando.

O que o sr. espera da política externa do Obama?

Acho que vamos ver uma política externa mais multilateral, que coloca mais ênfase na diplomacia, e que usa mais o poder brando do que o governo Bush.

Como essa estratégia pode funcionar no casa do Irã? Ainda é possível impedir o país de adquirir armas nucleares?

Eu acho que é possível, embora não seja fácil, ampliando-se as iniciativas diplomáticas, e colocando tudo em cima da mesa. Ainda é possível oferecer ao Irã uma abordagem que o deixe em melhores condições do que desenvolvendo armas nucleares. E certamente vale a pena tentar isso. E isso é o que a futura secretária de Estado, Hillary Clinton, disse.

Que "cenoura" poderia ser oferecida para o Irã, na sua opinião?

Há algumas áreas em que os Estados Unidos e o Irã têm interesses comuns, como, por exemplo, a estabilidade no Afeganistão. No período logo depois da derrota do Taleban, em 2002, havia uma boa cooperação entre os Estados Unidos e o Irã. Há perspectivas para relações econômicas no futuro, e a eliminação de algumas das restrições econômicas que seriam possíveis no momento em que o Irã estivesse disposto a mudar sua política em termos de armas nucleares.

Mas, ainda assim, o discurso de Hillary Clinton foi duro em relação ao Irã, acusando-o de interferir em outros países e patrocinar o terrorismo.

Sim, ela disse que esses eram temas que causam preocupações, mas, por outro lado, o presidente Obama afirmou que não haveria precondições que nos impeçam de conversar com o país. Então eu acho que isto é o que faz a diferença.

A invasão de Gaza parece ser o primeiro grande desafio de política externa para o governo Obama. Como exercer o poder inteligente com o Hamas?

Bem, precisamos ver se um cessar-fogo será alcançado antes que Obama assuma. Eu acho que será, mas se não for, esse teria que ser um dos primeiros trabalhos do novo governo. O próximo passo seria implementar um processo de paz mais amplo entre Israel e os palestinos. E isso não teria um foco só no Hamas, mas sim na questão mais ampla de como se obter uma solução estável com dois Estados, o que requer que se busque o Fatah.

Como a crise financeira global vai afetar a política externa dos EUA?

Nós já vimos a expansão do G-8 para o G-20, que inclui o Brasil. Então isso é um efeito que já podemos perceber. O fato de que nos movemos do G-8 para o G-20 é uma indicação clara de que devemos ampliar a participação. Uma das consequências já causadas pela crise financeira mundial foi a de ter ampliado a diplomacia

Nenhum comentário:

Postar um comentário

FACEBOOK