Grassley, o inimigo do Brasil em Washington



EUA : Senador republicano é um expoente entre adversários do país




Alex Ribeiro
De Washington

Maior adversário de interesses brasileiros no Congresso americano, o senador Chuck Grassley, 77 anos, deixa em janeiro a liderança republicana no comitê de finanças do Senado, cargo que lhe dava poder e visibilidade. Agora, ele será apenas mais um senador, mas promete seguir infernizando o Brasil.

“Ele vai continuar a falar as mesmas coisas”, avisou um assessor de Grassley numa conversa recente com diplomatas brasileiros. Grassley é um dos principais articuladores da prorrogação do sistema que barra a importação do etanol brasileiro. Ele já defendeu de forma vocal a saída do Brasil do Sistema Geral de Preferências (SGP) e emperrou por meses a confirmação do embaixador americano no Brasil.

A comissão de finanças é uma das mais importantes porque, entre outras coisas, cuida de assuntos de comércio exterior, como tarifas de exportação e acordos de livre comércio. Grassley ocupou cargos-chave por dez anos, primeiro como presidente e depois como líder da minoria republicana na comissão. Deixará a função porque as regras internas do Partido Republicano impedem que seus parlamentares exerçam a liderança por mais de seis anos.


Boa parte dos atritos de Grassley com o Brasil ocorreram porque ele representa um Estado com agricultura forte, que lidera a produção americana de milho, etanol, soja e suínos. Os subsídios e barreiras ao ingresso de produtos agrícolas estão entre os pontos mais controversos na agenda brasileira de negociações bilaterais com os Estados Unidos e nos fóruns internacionais de liberalização comercial, como na Rodada Doha.

Por causa das posições brasileiras na Rodada Doha, Grassley chegou a defender a saída do país do SGP, que isenta do pagamento de tarifas cerca de 3.500 produtos exportados aos Estados Unidos pelos países menos desenvolvidos. Pelo discurso do senador, o problema não está nos subsídios e barreiras agrícolas impostos pelos Estados Unidos, mas sim na resistência do Brasil em reduzir as tarifas de importação de manufaturados e de serviços.

“[O Brasil e a Índia] são os países com maior responsabilidade na paralisia da Rodada Doha”, disse Grassley, num pronunciamento em 2006. “Talvez esses países e outros beneficiários do SGP sintam que não precisam de um acordo em Doha, porque a situação atual já serve aos seus interesses.” Grassley atribui ao Brasil boa parte da culpa pelo fracasso das negociações para a criação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca).


Há algumas semanas, Grassley foi o grande articulador da prorrogação por mais um ano do sistema que barra a entrada do etanol brasileiro nos Estados Unidos. O governo americano concede um subsídio de 0,45 centavos de dólar por galão (3,8 litros) de etanol misturado à gasolina, além de impor uma tarifa de 0,54 centavos de dólar à importação do produto.


Na undécima hora, Grassley conseguiu enfiar a renovação dos benefícios num projeto que trata de um assunto completamente diferente, a prorrogação de cortes de impostos feitos pelo ex-presidente George W. Bush, cuja aprovação o governo Barack Obama considerava essencial para evitar um novo mergulho recessivo da economia americana.


“Trabalhamos duro durante três anos para derrubar a tarifa e o subsídio e, nos 44 minutos do segundo tempo, o Grassley achou uma brecha para prorrogá-los”, comentou um dos membros da força-tarefa brasileira em Washington que tenta derrubar o sistema.


Em 2009, Grassley segurou no Congresso por alguns meses a indicação do atual embaixador americano no Brasil, Thomas Shannon, que havia dado declarações em favor da derrubada do sistema de subsídio ao etanol. Ele só liberou depois de receber uma carta da secretária de Estado, Hillary Clinton, assegurando que o governo seguia apoiando o subsídio.

Grassley tem 51 anos de vida pública, numa carreira iniciada como deputado estadual em Iowa. Ele chegou ao Senado em 1980, junto com a onda republicana que levou Ronald Reagan a presidência dos Estados Unidos, e desde então nunca perdeu uma eleição. A mais recente foi em novembro, quando o apoio de 64,5% dos eleitores lhe garantiu mais seis anos de mandato. A candidata democrata derrotada, Rosanne Conlin, não seria muito diferente para o Brasil — ela também apoia, por exemplo, o subsídio ao etanol. Grassley cuida bem de sua base eleitoral. Ele passa praticamente todos os fins de semana em sua fazenda em Iowa e faz visitas anuais a cada uma das 99 cidades do Estado.

Embora pertença a um partido hoje minoritário no Senado, Grassley é forte porque nenhum dos partidos têm uma maioria absoluta na casa, o que obriga a negociação quase permanente entre os dois lados. Todas as semanas o líder da Comissão de Finanças, o senador Max Baucus, se reunia com Grassley, que é particularmente conhecido por costurar consensos.


O novo líder republicano na Comissão de Finanças será o senador Orrin Hatch, do Estado de Utah, e a expectativa brasileira é que ele seja mais favorável a queda de barreiras comerciais e à redução de subsídios agrícolas. Ele é alvo do Tea Party nas eleições de 2012, e algumas associações ligadas a esse movimento conservador estão pedindo cortes de subsídios agrícolas como o do etanol.

Há duas semanas, Baucus e Hatch prepararam uma homenagem surpresa para Grassley na última reunião da Comissão de Finanças do ano. Em tom de despedida, os colegas fizeram brincadeiras e entregaram uma caixinha com uma placa comemorativa pelos dez anos de serviço. “Não sei se vocês perceberam, mas fui reeleito”, disse Grassley. “Vou ficar mais algum tempo por aí.”


Fonte: Valor Econômico





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